Festa dos Espíritos Famintos - 鬼节/中元节


É difícil não nos “confrontar” com a Festa dos Espíritos Famintos (鬼节, “Guijie” em mandarim), pois é impossível não depararmos com as inúmeras oferendas existentes na rua, praticamente todas as noites a partir do décimo quinto dia do sétimo mês lunar (Agosto).
Segundo a crença popular, é nesse dia que o protector dos mortos, Dizang Wang (地藏王), abre os portões do “inferno” que separam o mundo no qual vivem os homens, do mundo dos mortos, permitindo assim aos espíritos invadirem a terra em grande número. Alguns deles terão a possibilidade de atingir uma condição mais feliz, através desta celebração. Por essa razão, a festividade é também conhecida por “Festa Universal da Salvação”.
Estes são geralmente, espíritos que não têm nenhum descendente vivo que possa prestar-lhes culto, ou espíritos de suicidas, de vítimas de homicídio e acidentes ou ainda de doidos, de criminosos, etc., ou seja, espíritos sem familiares de quem possam receber as devidas honras, espíritos daqueles que sofreram uma morte considerada violenta e acidentale e que não tiveram um funeral adequado e espíritos daqueles que viveram a vida de uma forma “incorrecta”. Atribuem-lhes os desastres, a morte das crianças, o alcoolismo, a perda do emprego, o azar no jogo, enfim, toda uma série de desgraças.

Sendo que durante este mês todos estes espíritos malignos e perdidos vagueiam pelas ruas e avenidas, mares e campos, atormentando tudo e todos, são queimados nas ruas (sendo espíritos solitários e desconhecidos não têm direito a altares nem a templos), direitamente no passeio, tiras de papel de diferentes cores, que simbolizam as roupas, dinheiro e lingotes de ouro de papel, velas e incenso em grande quantidade e alimentos como pato, leitão, galinha, bolos, frutas, aguardente e até cigarros. Este hábito de ofertar comida e outros bens é uma característica de tradição budista e está presente em todas as celebrações religiosas chinesas.
Estes espíritos “desemparados” têm assim a oportunidade de se acalmarem e de obterem melhores condições de existência extra-terrena, podendo atenuar o seu sofrimento e tormento.


Os espíritos não podem nem devem entrar nas casas, daí as oferendas ocorrerem na rua e à porta dos prédios e de algumas lojas. São colocados à disposição da população, bidons adaptados para a queima de oferendas.
As oferendas feitas nas esquinas, em plena rua, deixam os passeios repletos de ofertas, esperando assim, que os espíritos se sirvam à vontade.
O esbanjamento é uma das características desta celebração e habitualmente paira no ar fumo e o cheiro a papel e incenso queimado, voando também múltiplas cinzas.


São espíritos a evitar. Geralmente na noite anterior ao dia em que as portas do “inferno” se fechem, as pessoas tentarão evitar sair à noite.
Tenho amigos macaenses que dizem não acreditar nestas “superstições dos mais velhos”, no entanto, alguns deles não sairão nessa noite porque as mães recomendaram-lhes para não o fazer. É caso para dizer “não acredito em bruxas, mas que as há... há!”.

No mar, os pescadores fazem as suas oferendas para o mar, lançando para a água arroz, frutos e barcos de papel. Estas oferendas destinam-se às almas que pereceram no mar.

Durante a festa de Zhongyuan Jie (中元节), designação taoista para a Festa dos Espíritos Famintos, os monges entoam orações nos templos, afim de acalmar os espíritos, para que possam regressar ao seu mundo, fornecendo-lhes uma condição mais feliz e deixar assim o mundo dos vivos em paz.
No budismo, realiza-se uma cerimónia para aliviar os espíritos do “inferno”. Geralmente, no templo de Guan Yin, em Macau, são montados altares que ficam à disposição dos devotos para efectuarem as oferendas de incenso e dinheiro de papel aos espíritos dos seus antepassados. Entretanto, bonzos realizam cerimónias de homenagem aos mortos, entoando orações, tocando tambores e outros instrumentos, na presença dos familiares que, respeitosamente, assistem aos rituais.

Chegado o dia 30 do mês, todos os espíritos errantes são obrigados a regressar; os portões do inferno voltam a fechar-se, permitindo que a vida, na terra, retome a sua normalidade.

Apesar de ter já visto homens e jovens realizarem as oferendas na rua, são essencialmente as mulheres e o mais velhos quem as fazem.
As oferendas fazem-se habitualmente de noite.

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